junho 19, 2007

As lutas da juventude se renovam, mas nunca se esgotam

Por Caio Botelho*

4 de junho de 1977: há trinta anos atrás estudantes universitários brasileiros organizavam, na UFMG, o seu 3º Encontro Nacional, onde pretendiam reforçar o coro em defesa da anistia e contra a ditadura militar, que já vinha dando claros sinais de desgaste. No entanto, a retaliação do regime dos generais não tardaria e o Encontro acabou com mais de 400 estudantes presos.

Em protesto, milhares de universitários de São Paulo declararam greve e realizaram em setembro do mesmo ano o Encontro que havia sido frustrado pelas forças da repressão. Foram mais de dois mil estudantes reunidos na PUC/SP, que mais uma vez sofreriam a violência da ditadura militar através da invasão ao campus onde estava sendo realizado o evento, resultando em dezenas de feridos, muitos em estado grave. O que os generais não imaginavam era que isso só serviria para acalorar mais ainda o movimento estudantil brasileiro.

Outras mobilizações ainda seriam feitas pelos estudantes contra a ditadura. Nesse sentido, a reconstrução da UNE em seu 31º Congresso, realizado em 1979 na cidade de Salvador, consistiu um grave golpe ao interesse da ditadura em prolongar sua existência. O regime militar ainda apelaria para a tentativa de expulsão do país do presidente eleito na capital baiana, Javier Alfaya, com o argumento de que o mesmo não havia nascido em solo brasileiro, desconsiderando o coração verde e amarelo desse militante comunista. A resposta foi o lançamento da campanha “Javier é brasileiro”, que contagiou milhares de estudantes que sabiam que a defesa do presidente da UNE era também a defesa da liberdade e da democracia.

Anos mais tarde, os caraspintadas tomariam as ruas do país no maior movimento juvenil de nossa história, em 1992. Lutavam pelo impeachment do Fernando Collor de Melo, que além de tentar implantar no Brasil a agenda neoliberal com uma política que chegava a propor a cobrança de “taxas de manutenção” nas Universidades Federais, também era acusado de dilapidar o patrimônio do povo através de um poderoso esquema de corrupção. Pesava também contra o “presidente colorido” o confisco da poupança do povo brasileiro, gerando um descontentamento acentuado pela grave crise econômica.

É consenso afirmar que a participação dos jovens na campanha pela cassação de Collor foi fundamental para a vitória do movimento que, caso fosse derrotado, seria obrigado a organizar a resistência a implantação das medidas antipovo que estavam sendo postas em prática pelo presidente e sua camarilha.

No entanto, a crise ideológica ocasionada pelo colapso do socialismo no início dos anos 1990 e que afligiu dezenas de dirigentes do movimento estudantil, somado ao bombardeio sofrido pela juventude através dos meios de comunicação, que radicalizaram na disseminação de valores como o individualismo e o consumismo, tornaram a luta juvenil mais complexa, iniciando uma longa fase de ausência de grandes campanhas nacionais que envolvessem toda a juventude.

Nesse contexto, os setores reacionários do nosso país aproveitaram para difundir a tese que pregava a “morte” do movimento juvenil. Por outro lado (ou melhor, do mesmo lado dos reacionários) grupos radicalóides, culpando a “direção do movimento” pelo refluxo, caíram como patinhos no jogo dos poderosos e hoje tentam dividir os estudantes brasileiros. Chegam ao ponto de atacar a própria UNE e UBES, construindo entidades paralelas as mesmas. Fato interessante é que essa esquerdalha, mesmo apontando defeitos nas correntes de opinião majoritárias do movimento estudantil e acusando-a de responsável por todas as pragas possíveis, nunca tiveram a menor competência em convencer os estudantes brasileiros de suas próprias idéias, tampouco construíram um décimo sequer das lutas desenvolvidas pelos atuais dirigentes dessas entidades.

Mas na contramaré dos oportunistas, o movimento estudantil de luta, que encarna a ousadia e a audácia que marcaram as gerações anteriores, deu a devida resposta. Em agosto de 2003, quando do aumento da tarifa do transporte público em Salvador, manifestações realizadas em repúdio ao reajuste fizeram eclodir o maior movimento de rua dos estudantes desde o Fora Collor. A cidade que fez renascer a UNE agora era palco de mais um capítulo da história dos estudantes brasileiros. Durante semanas a capital da Bahia foi paralisada pelos protestos.

Mas a maior surpresa veio meses depois, quando a prefeitura de Florianópolis decidiu seguir o mesmo caminho de Salvador e decretou um absurdo reajuste em sua tarifa de ônibus. Pensavam os empresários do transporte e os governos irresponsáveis que o episódio anterior tinha ficado na história e nunca mais seria repetido. Ledo engano, mais uma vez a rebeldia da juventude ocupou as ruas e garantiu a vitória do movimento. O mesmo aconteceu em São Paulo, BH, Porto Alegre, Natal, novamente Salvador... e enfim, virou tradição os estudantes pintarem suas caras quando seu direito de ir e vir era ameaçado.

As recentes ocupações de reitorias, iniciadas com a USP em São Paulo e seguidas por outras dezenas de Universidades também marcam um novo espírito do movimento estudantil. A retomada da sede da UNE na Praia do Flamengo, 132, Rio de Janeiro, que havia sido incendiada pela ditadura e transformada em estacionamento em tempos recentes, é brilhante pelo resgate histórico que faz. Foi emocionante quando mais de cinco mil estudantes, no encerramento da 5º Bienal de Arte e Cultura da UNE, realizada na cidade maravilhosa, marcharam ao local da sede histórica de braços dados com ex-presidentes da entidade e derrubaram o portão de acesso ao “estacionamento”, iniciando um acampamento que durou mais de quatro meses, até sair a decisão da justiça reintegrando a posse do terreno à UNE, onde será construído o Museu do Movimento Estudantil e o Teatro dos Estudantes, com um projeto cedido por Oscar Niemeyier.

A verdade mesmo é que iniciativas como estas, e outras que foram postas em prática ou estão em curso, demonstram que o espírito rebelde e contestador da juventude se mantém vivo, mesmo com os incessantes ataques dos setores conservadores. Vivemos um período de lutas difíceis sim, mas que nunca deixarão de encontrar nos jovens carapintadas fiéis seguidores de bandeiras em defesa da educação, moradia, transporte de qualidade, emprego, etc.

Cabe às organizações de luta – entre elas destaco a União da Juventude Socialista – se esforçar – como esta vem fazendo – para politizar ainda mais os jovens brasileiros, tornando-os sujeitos críticos e conscientes da realidade de um sistema que carece de ser substituído. É preciso reforçar mais ainda as lutas que estão por acontecer, radicalizando sempre que necessário e espalhando aos quatro cantos que o sonho ainda vive!

*Caio Botelho é da direção estadual da UJS/Bahia e membro da Escola de Formação Loreta Valadares

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